Da Ficção à Realidade

 

             A ciência forense nunca foi um tema tão popular como na actualidade, no entanto as séries policiais, mais ou menos ficcionais, sempre despertaram a atenção do nosso público. A ciência forense sempre foi a espinha dorsal dos contos de mistério, desde as aventuras de Dupin, de Edgar Allan Poe, até as histórias de Sherlock Holmes, de sir Arthur Conan Doyle, da série televisiva Quincy, de Jack Klugman, até os actuais programas de investigação criminal de grande sucesso. Os métodos de Sherlock Holmes antecederam muitas técnicas verdadeiras (usadas hoje em dia) para ligar uma prova física a um criminoso, como por exemplo o exame de sangue o que provou que naquela altura, as técnicas que dizíamos ser ficção tornaram-se realidade. No entanto, as séries de CSI tem não só atraído as pessoas, como também tem estimulado a curiosidade pela Criminologia e  pelas Ciências Forenses.

 «Esta é uma das profissões preferidas do século XXI», revelou José Manuel Anes, ex-responsável do laboratório de Polícia Científica da Polícia Judiciária.

             Se por vezes o que se passa nos filmes está bem longe da vida real, o que se passa na série - os procedimentos técnicos e científicos utilizados - são os mesmos que os laboratórios da especialidade usam. Sob o ponto de vista técnico-científico não há grandes diferenças, comentam os especialistas em Ciências Forenses. Contudo, existe uma diferença que para o investigador é fundamental e que se prende com o tempo real de resposta. Existe um grande abismo entre a percepção do público e a realidade, ao que muitos chamam de “efeito CSI”. Este efeito caracteriza-se por influenciar opiniões, mesmo casos em julgamento, pois muitos juízes, jurados e advogados são influenciados pelo que vêm nas séries televisivas e isso condiciona todo um processo de julgamento. Existem casos, em que muitos arguidos foram absolvidos, porque no ponto de vista dos jurados se não houvesse determinado tipo de provas, não se podia provar a culpa de um suspeito. Ou mesmo advogados que defendiam o seu cliente dizendo que o facto de não existir determinada prova ou teste, eram a confirmação de que o arguido era inocente. Infelizmente, era esquecido, coisa que nas séries televisivas não acontece. Outras diferenças são que se na série rapidamente se chega ao autor do crime, na vida real nem sempre é assim, há processos que demoram mais tempo a ser analisados do que outros.

            Naturalmente que o mundo fantasista da ficção, obrigatório em qualquer argumento que se quer bem sucedido, implica uma envolvência que não se adapta à vida real. Na série dão um ar de uma grande facilidade e uma grande rapidez, coisa que não acontece na realidade, mas esta não é a única diferença, e se no CSI o «inspector que faz a investigação criminal também analisa as provas no laboratório», esta situação raramente acontece nos laboratórios verdadeiros onde cada pessoa tem a sua função, e só trabalha especificamente numa coisa. A ciência forense abrange diversos ramos, por isso existe especialistas para cada tipo de tarefa. Existe um grupo de especialistas que são formados para apenas recolher provas da cena do crime, a que se dá o nome de Investigação. A investigação pode determinar se, em vez de ser ela própria a recolher provas, deverá ser o Laboratório (grupo de pessoas especializadas em análises de provas químicas ou biológicas). Quanto aos suspeitos apenas são interrogados pela Policia técnica. Em cada episódio, um grupo da polícia forense analisa de forma fria e calculista cada detalhe do crime, na tentativa de obter uma solução deste mesmo. A Polícia Científica tem a seu lado a ciência e a experiência para decifrar crimes, que pareciam ser impossíveis de resolver.

            Apesar do êxito, e talvez por ele, o CSI levanta várias questões. Especialistas afirmam que o sucesso da investigação na série pode gerar expectativas irreais no público, relativamente à Polícia Científica, já que cada episódio termina com um final feliz em que a equipa de investigadores aplica, engenhosamente, a ciência repleta de recursos ao seu dispor desvendando o criminoso e como aconteceu o crime.

            Vemos também em séries, que um espaço se divide em laboratório, em sala de interrogatório e em escritório. Na verdade, isso não acontece. Depois das provas recolhidas, estas são enviadas para laboratórios tendo em conta o seu tipo. Em seguida, são esperados os resultados, e cada prova é analisada por ordem de chegada, o que condiciona o tempo de investigação, logo o processo não será encerrado tão rapidamente como vemos em aproximadamente 45min de CSI. Para além disso, existe também o tempo que os especialistas demoram a interpretar todas as provas e resultados.
Em ficção existem todo o tipo de aparelhos, para analisar todo o tipo de provas, um pequeno aparelho distingue tudo o que se encontra numa peça de roupa, ou mesmo todos os químicos presentes no ar. Infelizmente ainda não temos este tipo de equipamentos na vida real, o que dificulta o trabalho dos nossos especialistas. Portanto muitos daqueles aparelhos que vemos e que facilitam em muito, a vida aos investigadores de CSI, nem sequer existem.

            Um ponto a favor da ficção foi o aumento dos investimentos no campo da pesquisa. Muitos laboratórios foram equipados com melhores ferramentas de trabalho, o que proporciona uma melhor análise de provas e, por conseguinte, uma maior facilidade na resolução de casos. O outro lado bom de tudo isto foi o facto do público desenvolver um grande fascínio e respeito pela ciência forense, o que levou a que esta área esteja a ser bastante procurada, surgindo assim maior diversidade de cursos nas Universidades.

            O bom de séries que abordam a ciência forense foi ironicamente citado até mesmo dentro de um dos episódios de CSI, no qual uma equipa de televisão acompanhava as actividades dos investigadores fictícios e o líder, Gil Grisson, rejeitou a presença do grupo com argumentos de que haviam "demasiados programas de investigação criminal na Televisão". Muitos advogados e juízes que acreditam que os jurados são influenciados pelo efeito CSI concordariam. Até que ponto isso é verdade? Apesar da evolução ao nível dos materiais de laboratório e técnicas de investigação, o facto é que ainda há bastante margem de avanço, até nenhum criminoso passar impune, até que nenhum indivíduo passe por criminoso, estando inocente. Este enorme desejo, faz com que certas técnicas e máquinas sejam imaginadas, e postas em prática nas séries televisivas, dando a conhecer ao telespectador detecções de provas que não podem ser detectadas, máquinas inexistentes (por exemplo, as que permitem detectar todos os componentes de uma (muito) pequena amostra de ar, ou de um material.) tempo recorde em termos de investigação e, uma muito desejada taxa de sucesso a rondar os 100%.

            Quais as consequências do sucesso destas séries? Pensamos que tudo é realidade, quando na verdade, metade é ficção. Já foram documentados casos de certos juristas e advogados que pediram exames que não existiam. Estamos perante um efeito CSI? O futuro o dirá. Mesmo assim é afirmado que Portugal é um dos países que se encontra na vanguarda no que diz respeito à tecnologia forense.

            Em Portugal, o laboratório de Polícia Científica situa-se na cidade de Lisboa e é neste que se realizam todas as perícias a nível nacional no campo da biologia, da toxicologia, da físico-química, da balística, da documentoscopia e da criminalística.