Insectos revelam data da morte
Gil Grissom, herói de ‘CSI Las Vegas’, é um dos responsáveis pelo êxito da disciplina – a ciência que determina a morte da pessoa a partir dos insectos que colonizam o seu cadáver. É assim, mas não de uma forma tão rápida e tão precisa como na série televisiva.
É mesmo verdade. As moscas são as primeiras a aparecer quando há algo em decomposição. Também é assim com os cadáveres. As várias espécies de moscas vão-se sucedendo, como os vários tipos de insectos, que vão deixando o “testemunho” de acordo com os seus apetites.
Ao estudo de toda esta sucessão chama-se entomologia forense. A ciência que pode dizer há quanto tempo a pessoa morreu, em que estação do ano e onde. E mais um ou outro dado que pode complementar a investigação criminal.
A ciência dá os primeiros passos em Portugal e através de Catarina Prado e Castro, que, em breve, se tornará na primeira doutorada no País em Entomologia Forense, habilitação que está a concluir entre Portugal e Espanha.
Os cadáveres em decomposição constituem o seu objecto de estudo. Quer perceber de que forma as espécies colonizam um corpo em Portugal e aplicar essa observação à perícia criminal. É que este processo está intimamente ligado à temperatura ambiente, logo, ao clima e ao local onde se dá a decomposição do corpo.
As Calliphoridae (varejeiras) são as primeiras a aparecer. Apoderam-se dos orifícios e das feridas e ali põe os ovos. Depois nascem as larvas – as grandes consumidoras de biomassa -, que crescem até se encasularem, dando lugar às pupas (crisálidas), que por sua vez se transformam em moscas. E assim sucessivamente. Quando o entomólogo analisa um corpo, vai ter de fazer contas para trás, ou seja, perceber quando ocorreu a morte.
A datação tem, apesar de tudo, limites. Mas há poucas alternativas: a partir das 72 horas, os patologistas têm dificuldade em saber quando a pessoa morreu.
“Através do estudo de insectos, posso dizer há quantos dias a pessoa morreu e até um período de 40 dias, no máximo 60. Quando já está muito decomposto e a actividade dos insectos é menor, não posso dar o número de dias, mas a estação do ano”, explica Catarina Prado.
Foi assim que a investigadora conseguiu perceber que um corpo encontrado em Março na serra da Arrábida, em Setúbal, correspondia a uma pessoa desaparecida em Outubro.
Catarina Prado conta o caso de um cadáver já esqueletizado, de identidade desconhecida. “Pensei que só fosse possível dizer: ‘Está morto há mais de 40 dias.’ Mas o cadáver tinha casulos de uma espécie que não há no Inverno (Chrysomy megacephala) e foi possível dizer que, pelo menos a morte não tinha ocorrido nesta estação do ano.” E isto significa que se eliminaram todos os desaparecidos no Inverno, listas que a PJ disponibiliza.
Outra das possibilidades da área é perceber se a pessoa faleceu no local onde foi encontrado o corpo ou se foi deslocada, se morreu numa casa ou ao ar livre, por exemplo.
Mas a análise do entomólogo não se fica pela verificação da fauna. A análise do suco gástrico de uma larva (o que comeu) pode indicar se é massa do cadáver (se não for, o insecto é eliminado) e detectar a presença de drogas quando essa investigação já não é possível de detectar no cadáver, por quase só existir esqueleto. Permite, até, tirar uma amostra de ADN para comparação.
E há toda uma série de dados complementares para a investigação policial que podem ser dados por esta ciência, nomeadamente, chamar a atenção para feridas, sémen ou outros líquidos e fluidos. É que as moscas procuram em primeiro lugar os líquidos, daí que se instalem nos orifícios e feridas.
in, Diário de Notícias